Observatório da Deficiência e Direitos Humanos

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Pessoas com Deficiência em Portugal - Indicadores de Direitos Humanos 2020

Capa do Relatório 2020 Capa do Relatório 2020

Muitos apoios e serviços essenciais para as pessoas com deficiência - tais como terapias ou consultas médicas -, foram retomados apenas parcialmente ou ainda estão suspensos, insatisfação com o acompanhamento dado aos alunos com deficiência, mesmo após a reabertura das escolas, elevados níveis de ansiedade, tristeza e preocupação com um possível agravamento da sua situação económica, e ainda familiares e cuidadores/as que expressam cansaço e exaustão, embora se registem melhorias após o desconfinamento - estes são alguns dos principais resultados do estudo “Deficiência e Covid-19 em Portugal”, promovido pelo Observatório da Deficiência e Direitos Humanos (ODDH) do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa (ISCSP-ULisboa). Adicionalmente, será também apresentado o Relatório “Pessoas com Deficiência em Portugal – Indicadores de Direitos Humanos 2020” que, entre outros dados, mostra que em junho de 2020 havia 13270 pessoas com deficiência inscritas como desempregadas nos centros de emprego, registando-se um aumento de 10% face aos dados globais de 2019 (12027 inscritos com deficiência). (Ficheiros disponíveis para download no final desta página).

Estudo “Deficiência e Covid-19 em Portugal”

Face à crise pandémica provocada pelo novo coronavírus (Covid-19), o ODDH procurou perceber, como, em Portugal, esta situação estaria a ser experienciada pelas pessoas com deficiência e respetivas famílias. Para o efeito foram realizados dois estudos exploratórios por questionário (online), tendo sido obtidas 1051 respostas: Estudo 1, na fase de confinamento (n=725) e Estudo 2, na fase de desconfinamento (n=326). Nos inquéritos realizados foram recolhidas informações, entre outros aspetos, sobre os impactos da pandemia: no acesso a apoios e serviços (Estudo 1 e 2); no acesso à educação e ensino (Estudo 1 e 2); e na saúde e bem-estar psicológico das pessoas com deficiência e cuidadores/as (Estudo 2).

Relativamente aos apoios e serviços, na sequência do encerramento de equipamentos de apoio social na área da deficiência, em março de 2020, 40,1% (n=286) dos/as inquiridos/as do Estudo 1 responderam que lhes foram retirados apoios ou serviços. No Estudo 2 procurou-se perceber em que medida alguns destes apoios e serviços já teriam (ou não) sido retomados. Os resultados mostram que, em muitos casos, estes apoios e serviços foram retomados apenas parcialmente ou continuam suspensos: Centros de Atividades Ocupacionais (46,2%), fisioterapia (56,7%), terapia da fala (46,8%), terapia ocupacional (62,3%), consultas médicas (52,8%) e cuidados de enfermagem (45,3%).

No que respeita à área da educação, as soluções disponibilizadas aos estudantes com deficiência - durante o período de confinamento e desconfinamento - foram avaliadas de forma negativa, pese embora se tenham registado ligeiras melhorias entre os dois momentos. No Estudo 1, dos inquiridos que responderam ser estudantes, ou estarem a acompanhar os filhos com deficiência que frequentam o ensino pré-escolar, básico ou secundário (n=217), 77,9% (n=169) avaliaram as modalidades de ensino à distância de forma negativa. No Estudo 2, as respostas relativas aos alunos que frequentavam o ensino obrigatório (n=34) foram as seguintes: 64,7% (n=22) consideraram que estas estavam a ser nada adequadas (n=9; 26,5%) ou pouco adequadas (n=13; 38,2%), e apenas 35,3% (n=12) consideraram que estas estavam a ser adequadas (26,5%; n=9) ou bastante adequadas (8,8%; n=3). Alguns testemunhos recolhidos no Estudo 2 ilustram algumas dificuldades que persistem, mesmo no ensino presencial, embora, em outros casos, também fossem notadas melhorias:


“Deixou de frequentar as poucas aulas a que ia ficando confinado na unidade de autismo, porque não consegue usar máscara.”

(E2_ID191_Cuidador/a de rapaz de 14 anos com deficiência, Lisboa)

“Já começou a trabalhar com o professor de ensino especial, mas os terapeutas ainda não estão colocados.”

(E2_ID220_Cuidador/a de menino de 12 anos com deficiência, Setúbal)

As e os inquiridos também responderam a algumas questões relacionadas com os impactos da pandemia no seu bem-estar psicológico: 51% (n=164) referiram que, desde o início da pandemia se têm sentido mais tristes ou deprimidos/as do que habitualmente, 58,4% (n=188) responderam sentir-se mais ansiosos/as do que habitualmente, e por fim, 39,3% (n=127) reportaram maiores dificuldades em dormir. A maioria dos e das participantes neste estudo (67,7%; n=214) afirmaram ainda que desde o início da pandemia sentiam uma preocupação acrescida relativamente a um possível agravamento da sua situação económica, contra 32,3% (n=102) que responderam que estavam nada ou pouco preocupados.

No Estudo 2 participaram também cuidadores/as e familiares de pessoas com deficiência (n=88), dos/as quais 83% (n=73) eram mulheres e 17% (n=15) homens. Questionadas/os sobre como se sentiram, durante o período de confinamento (após o encerramento de apoios e serviços) e mais recentemente, no período de desconfinamento (após a reabertura de apoios e serviços), os resultados evidenciam diferenças significativas entre este dois momentos: 73,4% (n=55) responderam que se sentiam muito ou bastante cansadas/os na fase de confinamento contra 47,7% (n=31) após a reabertura dos apoios e serviços (-25,7 pontos percentuais) e 64% (n=48) responderam que se sentiam muito ou bastante exaustos/as, contra 41,9% (n=26) após a reabertura de apoios (-22,1 p.p.). Relativamente à interferência dos cuidados prestados no exercício da atividade profissional das e dos cuidadores, 68,2% (n=58) responderam que a prestação de cuidados se refletiu de forma negativa no exercício da sua atividade profissional e apenas 31,7% (n=27) não expressaram dificuldades.

ODDH Deficiencia e COVID fig8

Alguns testemunhos recolhidos ilustram estas dificuldades:
“Tive de suspender a empresa para poder cuidar do meu filho e como sou sócio-gerente não me deram nenhum apoio. Já lá vão 8 meses sem nenhum apoio, vergonhoso, para quem pagou durante 20 anos tudo à segurança social e agora nenhum apoio, é vergonhoso.”

(E2_ID67_Cuidador/a de menino de 7 anos com deficiência, Faro)
“Eu mantive a minha atividade profissional a partir de casa, no entanto tive que trabalhar quase todas as noites para compensar o tempo em que durante o dia estava a prestar cuidados ao meu filho.”

(E2_ID236_Cuidador/a de menino de 10 anos com deficiência, Lisboa)


Relatório “Pessoas com Deficiência em Portugal - Indicadores de Direitos Humanos 2020”

Elaborado pelo ODDH e contando este ano com a sua quarta edição, o Relatório “Pessoas com Deficiência em Portugal – Indicadores de Direitos Humanos 2020” recorre a fontes secundárias de informação, nacionais e internacionais, para disponibilizar indicadores que permitam aferir o progresso alcançado na realização dos direitos humanos das pessoas com deficiência em Portugal. O referido relatório mostra que, em 2019, 4,2% (n=12027) das pessoas inscritas como desempregadas tinham deficiência, verificando-se uma descida de 1% (-108) face a 2018 (n=12135). Contudo, a redução do total de desempregados inscritos foi muito mais expressiva na população em geral, tendo abrandado 9%. Porém, só no primeiro semestre de 2020 verificou-se um crescimento de 10% face aos dados globais de 2019 (13270 inscritos), atingindo um valor que se situa ligeiramente acima do pico de desemprego registado neste grupo em 2016. 

Relatorio ODDH-2020 fig18

Estes dados revelam de forma bastante clara os impactos negativos da pandemia provocada pela Covid-19 no emprego das pessoas com deficiência, evidenciando a vulnerabilidade estrutural deste grupo no acesso ao emprego.

Relativamente à educação destaca-se um indicador relacionado com o abandono escolar. Os dados disponíveis do Inquérito Europeu às Condições de Vida e Rendimento (EU-SILC, 2018) mostram que (ver Figura 6), em 2018, a taxa de abandono escolar precoce nos alunos e alunas com deficiência com idades entre os 18 e os 24 anos em Portugal era de 21,9%, muito superior à média dos alunos sem deficiência em Portugal (+9,5 p.p.; 12,4%).

Relatorio ODDH-2020 fig6

Se fizermos a mesma análise considerando os jovens com idades entre os 18 e os 29 anos verifica-se que, em 2018, a taxa de abandono escolar precoce era ainda maior, situando-se nos 32%, quase o dobro da taxa verificada nos jovens sem deficiência do mesmo grupo etário (16,4%). Quando comparamos estes dados com os registados em 2015 (Pinto & Kuznetsova, 2017) constata-se que a redução da taxa de abandono foi mais forte entre os jovens sem deficiência (onde reduziu 5,4 p.p. no grupo dos 18-24 anos e 6,8 p.p. no grupo 18-29 anos), do que entre os jovens com deficiência (onde se registaram decréscimos de apenas 2,2 p.p. no grupo 18-24 e de 3,9 p.p. no grupo 18-24 anos), contribuindo assim para um agravamento do fosso entre a população com e sem deficiência.

Por sua vez, os dados relativos às Condições de Vida e Proteção Social mostram que no indicador risco de pobreza ou exclusão social há também um desfasamento considerável entre pessoas com e sem deficiência: em 2018 em Portugal o risco de pobreza ou exclusão social nas mulheres com deficiência (29,1%) era 11,2 p.p. superior ao risco enfrentado pelas mulheres sem deficiência (17,9%), e no caso dos homens era de 9,8 p.p. (28,1% vs. 18,3%).

Relatorio ODDH-2020 fig28

Este nível de desfasamento quase não se alterou desde 2016, quando o fosso no risco de pobreza entre mulheres com e sem deficiência se situava nos 10,2 p.p. e entre os homens com e sem deficiência nos 10,7 p.p. (ver Pinto & Pinto, 2018). Assim, apesar das melhorias registadas de uma forma global para ambos os grupos no que diz respeito à redução do risco de pobreza, as desigualdades mantêm-se quase inalteradas entre a população com e sem deficiência.

 

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